quarta-feira, 1 de novembro de 2017

Dualidade

Imagem retirada da Internet
Acompanho, ainda que, sem a profundidade que gostaria as questões da política internacional. Interesso-me pelo que se passa planeta e, não só no nosso civilizado Mundo. Por muito distante, quiçá pouco significativas para as sociedades ocidentalizadas, que possam parecer as questões dos povos indígenas do Brasil e de outros países da América do Sul, por muito distante que seja a Somália, ou as comunidades cujo acesso a água potável, continue a ser uma privação que mata. Por muito distante, ou que possa parecer que seja, interesso-me e preocupa-me. Claro que também me interessam os problemas domésticos e o dos nossos vizinhos em Espanha e na Catalunha ou, ainda que geograficamente mais distantes, mas politica, social e economicamente próximos, como sejam os desvarios, internos e externos, da administração Trump, mas também as tensões na península da Coreia. Tudo o que se passa no planeta mais tarde ou, mais cedo, acaba por ter reflexos na nossa vida. Afinal vivemos no espaço confinado de um planeta, onde todos somos afetados pelo que de bom ou mau se faz, seja aqui ao lado ou, no mais distante rincão da Patagónia ou, da Papua Nova Guiné.
Interessando-me e acompanhando o que se passa no Mundo tenho, porém, evitado escrever e partilhar alguma reflexão sobre algumas das questões que já referi e outras, como por exemplo a situação na Venezuela, da qual se deixou de ouvir falar tão de amiúde, talvez porque num recente ato eleitoral, Não, não foi para a constituinte, a oposição ao governo tenha sofrido uma das suas maiores derrotas. Como dizia, interesso-me e acompanho, mas na verdade tenho evitado escrever e comentar o que quer que seja que vá para além dos assuntos regionais e nacionais. Talvez por uma questão de hierarquização, pela atualidade temática, enfim prioridades, ou talvez por acaso. Talvez por qualquer uma das razões já enumeradas ou, quem sabe, e eu em boa verdade não sei, porque as corporações mediáticas intoxicam a opinião pública com uma visão unilateral dos acontecimentos, ou pura e simplesmente omitem a divulgação de alguns acontecimentos. Omissões que se devem, não tenho dúvidas, aos critérios editoriais. Critérios contra os quais não há nada a fazer, os critérios e editoriais que tudo justificam, mesmo o que não tendo fundamento nenhum, a não ser o dos donos das ditas corporações.
Depois destes dois longos parágrafos é legítimo perguntarem ao autor, mas afinal o que é que pretendes com esse arrazoado, Nada de especial, direi eu. Mas já que perguntam e para ilustrar o que tenho vindo a dizer vamos ao caso da declaração de independência da República da Catalunha, Pois o referendo também colocava essa questão, Independência e República. Quem analisa e trata estes assuntos com seriedade dirá, Nem podia ser de outra forma a separação de Espanha e a proclamação da República da Catalunha são indivisíveis. O certo é que a questão da proclamação da República não tem sido objeto de grande atenção pelas corporações mediáticas, o foco tem estado centrado apenas e tão-somente na independência. Mas isso são contas de outro rosário.
De momento importa perceber, se é que há alguma coisa para perceber, a dualidade de critérios jornalísticos, de posicionamentos políticos e institucionais sobre situações idênticas e que tiveram lugar no espaço europeu e nas últimas décadas. O reconhecimento internacional da independência da Bósnia-Herzegovina, da Croácia, da Macedónia, da Eslovénia, do Montenegro e, mais tarde, em 2008, o Kosovo, foi imediato. Todos eles eram territórios, em conjunto com a Sérvia, da antiga Jugoslávia, mas nem todos, ao longo da sua história, em algum momento constituíram estados independentes, como seja o caso da Bósnia-Herzegovina e do Kosovo.

Imagem retirada da Internet
Não pretendo trazer a história destas independências para este espaço e vou apenas deixar como exemplo a questão do Kosovo, região à qual se atribui a génese da Sérvia, por ser o paradigma da promoção artificial da formação de um Estado por interesses externos ao seu próprio povo e não haver, bem pelo contrário, razões de ordem histórica que justificassem a sua criação, aliás o processo que conduziu à independência do Kosovo só foi possível pela intervenção estrangeira, designadamente pela NATO que pela primeira vez assumiu uma atitude ofensiva, contrariando, assim seu próprio estatuto de organização defensiva. 
Um olhar sobre a comunicação social, da época, sobre a questão do Kosovo e a lista dos países que se apressaram a reconhecer a criação artificial de um novo estado, diz bem da dualidade de critérios jornalísticos, políticos e institucionais face a situações idênticas.
Ponta Delgada, 30 de Outubro de 2017

Aníbal C. Pires, In Diário Insular e Açores 9, 01 de Novembro de 2017

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