quarta-feira, 29 de novembro de 2017

Mais cinco anos a ser envenenados

De adiamento em adiamento até à decisão da União Europeia(UE) que vai continuar a permitir, por mais cinco anos e depois logo se verá, o uso de herbicidas à base de glifosato. Nada de novo, os lobbies comerciais sobrepuseram-se ao interesse público e a UE demonstrou, uma vez mais, que as pessoas e, neste caso, a saúde pública pouco ou nada contam nas suas decisões, importa mesmo é manter os negócios de quem vende o veneno e o antídoto. Sim, a mesma empresa que vende os fitossanitários e os herbicidas, produz e comercializa, também, produtos farmacêuticos.
Face aos indícios fundamentados em estudos, à posição das Nações Unidas e da Organização Mundial da Saúde, que não dando como confirmada, por os estudos não serem conclusivos, a ligação do uso de produtos à glifosato a um conjunto de malformações congénitas, autismo, efeitos desreguladores hormonais, mas também a questões cardiotóxicas e carcinogénicas. Por outro lado, está comprovado que esta substância, o glifosato, é encontrado no sangue, na urina e mesmo no leite materno em quantidades elevadas. Se outras razões não existissem era exigível que a UE se decidisse pelo princípio da precaução, ou seja pela sua proibição. Mas como já referi os decisores políticos voltaram a submeter-se aos lobbies comerciais.
Em 27 de Julho de 2015 apresentei uma iniciativa parlamentar que tinha como objetivo a proibição na Região Autónoma dos Açores da comercialização, manuseamento, armazenamento, utilização ou libertação no meio ambiente de todos os compostos que contenham Glifosato. A tramitação da iniciativa demorou alguns meses e subiu a plenário no dia 17 de Março de 2016. A iniciativa foi chumbada com os votos do PS e da direita parlamentar com a justificação que se aguardava, proximamente, uma decisão da UE e que a Região, então sim adotaria a decisão que viesse a ser tomada.

Foto by Aníbal C. Pires
E a autonomia, e a qualidade ambiental que não nos cansamos, e bem, de anunciar quando promovemos o destino Açores, e a saúde do povo açoriano. De nada valeram estes e outros argumentos para tentar inverter o previsível sentido de voto da direita e do PS, que utilizei para defender a proposta e a importância para a Região de se colocar na vanguarda das regiões e países livres deste agrotóxico.
A direita e o PS escudaram-se na UE e na falta de alternativas aos herbicidas com glifosato.
Quanto às alternativas foi demonstrada a sua existência pois, para além de métodos tradicionais foi dito, na altura, que 35% dos herbicidas disponíveis no mercado não contêm este princípio ativo, quanto à UE decidiu agora pelo prolongamento do seu uso por mais cinco anos.
A fazer fé do argumento utilizado pelo PS, em 2016, para que a minha proposta não tivesse sido aprovada na ALRAA isto significará que o povo açoriano vai continuar a ser exposto aos comprovados perigos dos herbicidas com base no glifosato. Perigos que por muito que os defensores do seu uso tentem minimizar, ou mesmo branquear, eles são reais e um problema que afeta a nossa qualidade ambiental e a saúde pública.
Por muito que a opinião europeia, e mundial, esteja contaminada pela campanha dos produtores deste e outros agrotóxicos, não é aceitável que perante situações conhecidas como a da Argentina, onde a relação causa efeito não deixa margem para dúvidas, se continue a prolongar o uso do glifosato, não só na Europa, mas no Mundo.

Ponta Delgada, 27 de Novembro de 2017

Aníbal C. Pires, In Diário Insular e Açores 9, 29 de Novembro de 2017

Sem comentários: