terça-feira, 12 de janeiro de 2010

Centralidades periféricas

Implantada bem no meio do Grupo Central, São Jorge goza de uma posição geográfica ímpar, que lhe devia proporcionar um papel mais destacado em termos das dinâmicas e sinergias que deveriam existir entre estas ilhas.
No entanto, a actual articulação do sistema de transportes não tem permitido desenvolver estes fluxos. Fluxos de produtos e investimentos, fluxos de gente, cultura e ideias. Fluxos que animam uma terra nos caminhos da modernidade sem esquecer o passado, fluxos que alimentam as actividades económicas e fixam as populações.
A visão do desenvolvimento no Grupo Central da Região Autónoma dos Açores tem de ultrapassar os estreitos limites “da minha ilha” para abarcar o âmbito “das nossas ilhas”, com as suas potencialidades comparativas, especializações e vantagens. As ilhas do Triângulo, bem como de todo o Grupo Central, têm de ser encaradas como unidades territoriais, não isoladas, mas comunicantes e que se potenciam umas às outras.
Assim, uma visão para o desenvolvimento da ilha de São Jorge que combata a centralização urbana e evite o esvaziamento das freguesias rurais, fixando actividades, equipamentos e populações, só pode ser pensada na articulação e ligação directa com as ilhas circundantes. A política de transportes, nomeadamente dos marítimos, é, por isso, uma questão estratégica.
O Governo Regional prometeu o grau mínimo das condições essenciais para essa articulação. Com pompa e circunstância anunciou, não a obra, mas a promessa: criar uma ligação marítima directa diária, durante todo o ano que una as ilhas do Triângulo deixando, ainda assim, fora da promessa as ligações marítimas à Terceira (a partir do Topo) e daí à Graciosa.
É caso para dizer que os jorgenses esperaram muito tempo para tão pouco!
De facto, só depois de anos de reivindicação, protesto e exigência das populações e dos seus representantes é que foi finalmente dado este pequeno e simples passo.
E, embora seja positivo e importante, foi dado de forma isolada e sem a necessária perspectiva estratégica abrangente que esta questão dos transportes marítimos de passageiros exige.
A carência desta visão deixa, assim, de lado outros passos fundamentais. Entre eles, as obras no porto do Topo que permitissem criar uma ligação marítima, permanente e regular, com as ilhas da Terceira e Graciosa que, afinal, são ali a dois passos. Outro, seria a existência de um verdadeiro serviço público de transportes terrestres, que o Governo poderia criar em articulação com os operadores, e que permitisse, apesar das características geográficas, quebrar o isolamento de populações e freguesias e, também, ajudar a dinamizar as actividades turísticas e ambientais.
Sem que exista esta visão estratégica por parte do Governo Regional, acompanhada das medidas e investimentos que a sua aplicação exige, continuaremos a assistir ao sufocar das potencialidades de São Jorge, e das ilhas vizinhas, invertendo os termos do progresso destas ilhas, tornando periférico o que é central.
Aníbal C. Pires, In AUNIÃO, 12 de Janeiro de 2010, Angra do Heroísmo

1 comentário:

Maria Margarida Silva disse...

Oi, Aníbal
“Outros passos fundamentais”, como dizes e bem, nomeadamente as obras no porto do Topo, a existência de um verdadeiro serviço público de transportes terrestres, a dinamização de actividades turísticas e ambientais… e aproveito para acrescentar, se me permites:
Para quando o novo Hospital de Angra, há tanto tempo prometido e sem passar da primeira pedra?
A iluminação da nova estrada e rotunda de ligação da circular a S. Carlos?
A colocação de mais psicólogos no Centro de Saúde de Angra (oferta de emprego, é só vê-la nos jornais…), já que quem está lá, nessa área, não dá vencimento ao atendimento aos utentes, pois até a licença de porte de arma também tem que passar por uma consulta dessa índole (não estou a pôr em causa a pertinência da mesma, claro)?
A assistência na Saúde para todos (médico de família, exames médicos atempadamente, sem se ter que esperar meses e meses por uma TAC, ecografias…)?
Os preços exorbitantes das viagens interilhas e para o Continente?
O abandono de centenas de trabalhadores, por parte das entidades patronais?
O crescimento constante do número de pobres?
A resposta para todas estas questões resume-se em três palavras:
INJUSTIÇA – INÉRCIA – INCOMPETÊNCIA

“Compreendi que não bastava denunciar a injustiça. Era preciso dar a vida para combatê-la.” Albert Camus

Um abraço.
margarida