segunda-feira, 4 de janeiro de 2010

Democratizar a globalização(*)

O processo de globalização, assente nos notáveis avanços das tecnologias de informação e comunicação constituem o principal suporte do processo de internacionalização e interdependências, da concentração e do domínio do capital financeiro e da desconcentração da actividade produtiva relativamente ao centros decisórios. A deslocalização de empresas na procura de baixos salários e de trabalho sem direitos, a especulação financeira e a criação de paraísos fiscais são um claro exemplo dos actuais “benefícios” desta mundialização que, em Portugal e na Europa têm tido as consequências que todos conhecemos – desemprego, pobreza, exclusão social e, não menos importante, um grande desencantamento com o sistema democrático que, obviamente, se tem traduzido pelo afastamento de muitos cidadãos (demasiados) do exercício do direito de cidadania.
Mas a utilização das tecnologias de informação e comunicação abriram, igualmente, possibilidades para a resolução de muitos dos problemas que actualmente afectam a humanidade. Só o domínio e a apropriação destas ferramentas tecnológicas, por parte dos grandes grupos económicos transnacionais, têm impedido a democratização do denominado processo de globalização. O que se exige não é o fim da globalização, antes pelo contrário, exige-se mais globalização, exige-se que a globalização seja económica, social e cultural e, que os progressos científicos e tecnológicos sejam internacionalizados e postos ao serviço do desenvolvimento e da realização dos indivíduos e dos povos.
O denominado processo de globalização nos países desenvolvidos e com o declinar do século XX, nomeadamente a partir da década de 80, foi acompanhado por um conjunto de procedimentos que têm vindo progressivamente a pôr em causa algumas das conquistas civilizacionais de ordem social, conseguidas através de uma tenaz luta política, sindical e social, e que são um atributo do século precedente. O crescente desequilíbrio na distribuição do valor acrescentado, com claro prejuízo para os assalariados (os que trabalham por conta de outrem), verificando-se uma tendência crescente para a baixa dos salários reais, o aumento do desemprego e a precarização das relações de trabalho, constituem sinais claros desta investida que tem produzido uma crescente expansão da pobreza e da exclusão nos países desenvolvidos.
Mas também, garantias colectivas como a segurança social, os sistemas de saúde e educação públicos e as aposentações têm sido alvo da gula dos que, em nome de relações laborais “modernas” e flexíveis e de “menos Estado melhor Estado”, procuram desmantelar as estruturas do estado social para delas se apoderarem (porque será?) e, estrategicamente, em nome da modernidade, presenteiam-nos com a individualização das carreiras profissionais, com a consequente atomização dos trabalhadores, pondo em causa as negociações colectivas e direitos consagrados, daí resultando graves discriminações sociais e salariais, hoje já bem evidentes e sentidos pelos trabalhadores quer do sector público quer do sector privado.
Esta estratégia do grande capital financeiro, montada em nome da (sua) globalização do comércio, da eficiência económica e do fim das ideologias, visa não só a desregulação dos mercados e o regresso a formas brutais de exploração do trabalho assalariado, mas, igualmente, o enfraquecimento e desmantelamento dos sindicatos e do movimento sindical e social.
Para esta ofensiva planetária dos grupos financeiros transnacionais, a que algum poder político se tem submetido e outro tem executado, a resposta dos movimentos sociais e políticos, que consideram que esta “globalização” não é uma inevitabilidade, tem de ser mundializada, ou seja, as lutas na defesa dos interesses e direitos dos trabalhadores, das minorias, dos imigrantes, ou a defesa da Escola Pública e do Serviço de Saúde Público ou ainda, a luta contra a pobreza e a exclusão, a luta pela paz ou pela qualidade ambiental deve assumir-se, aqui ou no mais recôndito lugar do planeta, como uma contenda de todos, pois a todos interessa e diz respeito.
(*) Este texto foi escrito e publicado em Abril de 2004 e a globalização da desgraça, infelizmente, acentuou-se daí a sua actualidade e pertinência. Um Bom Ano de 2010!
Aníbal C. Pires, IN AUNIÃO, 04 de Janeiro de 2010, Angra do Heroísmo

2 comentários:

Maria Margarida Silva disse...

Olá, Aníbal!
Mais um de tantos outros textos que tens escrito, ao longo destes anos todos. Actual e pertinente, tal como referes. 2010 começou e acho que chegou a altura de pores em prática um compromisso que vem de longe. Compromisso que tens para contigo, a tua família, os teus amigos, os teus leitores, enfim, todos aqueles que te admiram, gostam de ti e apreciam o que escreves.
Não podes fugir mais! Não adies mais!
Deixo-te com uma citação de um dos meus poetas preferidos. Pode ser que te sirva de inspiração…


“Não posso adiar para outro século a minha vida
nem o meu amor
nem o meu grito de libertação.
Não posso adiar o coração.”

António Ramos Rosa

Um abraço.
margarida

Aníbal C. Pires disse...

Olá Margarida,

Fica aqui o compromisso público que em 2010 publico:
- A Tese de Mestrado; e
- Um primeiro volume com textos que tenho publicado na imprensa regional.

A edição do trabalho de Mestrado está em fase de conclusão. Julgo que para o fim de Fevereiro, princípio de Março poderei fazer o seu lançamento.

Beijinhos e tudo de BOM,

Aníbal Pires