quinta-feira, 28 de janeiro de 2010

Cidadania e participação política

O PS, o PSD e o CDS/PP chumbaram, na Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores (ALRAA), uma proposta do PCP que tinha como propósito constituir-se como um, apenas um, pequeno contributo para a redução da abstenção política e eleitoral. A proposta do PCP consistia numa recomendação ao Governo regional para que, no dia em que os jovens residentes nos Açores completam 18 anos, atingindo em toda a plenitude (exceptuando a possibilidade da candidatura à Presidência da República) a sua cidadania e direitos políticos, lhes fosse ofertado um conjunto de documentos que conformam o nosso sistema politico – Declaração Universal dos Direitos Humanos, Constituição da República Portuguesa e Estatuto Político e Administrativo da Região Autónoma dos Açores.
Prática já instituída, por exemplo, na Andaluzia e que me parece merecer louvor porquanto só a integralidade destes documentos é a forma própria, solene e objectiva, de os conhecer. Ofertar estes documentos na data em que um jovem cumpre 18 anos de vida e assume, finalmente, a plenitude dos direitos e deveres da sua condição de cidadão é um momento solene e que deve ser devidamente assinalado. Um momento de celebração, mas também um momento que deve ser de consciencialização e crescimento enquanto actor activo na esfera social e política.
A iniciativa era oportuna e o seu propósito uma necessidade reconhecida transversalmente pelos actores políticos de todos os quadrantes (ou sextantes) políticos.
Oportuna não só porque saímos há poucos meses de um ciclo eleitoral que demonstrou gravíssimos níveis de abstenção que, aliás, na nossa Região assumiram proporções que revelam um alheamento preocupante dos cidadãos pela vida política.
Necessária porque é óbvio para todos que algo vai mal na nossa democracia. Algo vai mal quando mais de 78% dos açorianos não considera útil ir votar, como sucedeu nas últimas eleições para o Parlamento Europeu. Algo vai mal quando à mais nobre das actividades cívicas, ao exercício prático da Ética, o que o comum dos cidadãos associa é o descrédito, o desânimo e a decepção.
Qualquer discussão sobre este assunto será sempre superficial, académica e, mesmo, distanciadamente diletante se não abordar, com frontalidade e determinação, as causas profundas do problema. Tarefa que não cabe neste espaço e, por consequência, apenas vou referir, ainda que de forma muito sucinta, um dos aspectos onde residem as principais causas de tamanho alheamento.
São os partidos que têm exercido o poder neste país nos últimos trinta anos, num rotativismo aparentemente sem saída, que têm, de forma deliberada e consciente, empobrecido e esvaziado a nossa democracia. Semeiam a decepção quando rapidamente arrumam na gaveta dos chamados “imperativos de governação” as promessas eleitorais entusiásticas. Cultivam o desânimo quando tentam passar a ideia de que não há alternativas, apenas nuances de estilo, na governação do país, estando os portugueses eternamente condenados sempre a mais do mesmo, com actores variáveis. Espalham o desinteresse quando se atolam na pequena política e em estéreis conflitos para encher páginas de jornais, passando ao lado da política real que o país precisa. Quando a generosidade dos dinheiros públicos parece inesgotável para salvar desastrosos e obscuros negócios bancários enquanto se mostra sempre parca, sempre escassa para ajudar os portugueses em dificuldades.
Esta, não sendo a única, será uma das principais causas do afastamento dos cidadãos da vida política e do exercício pleno da cidadania.
Aníbal C. Pires, IN A UNIÃO, 27 de Janeiro de 2010, Angra do Heroísmo

2 comentários:

Sam disse...

Caro Aníbal,

a iniciativa apresentada pelo PCP, na última sessão plenária da ALRA, revestiu-se de total pertinência e, quem sabe, um dia, será levada adiante.

Mas na questão do desinteresse juvenil regional perante os sufrágios, já alguém abordou os jovens açorianos, cara-a-cara, para saber que imagem têm das figuras políticas internacionais, nacionais e regionais da actualidade? Se identificam-se com essas figuras? Se transmitem-lhes esperança para o presente e futuro?

Talvez os resultados de tal "estudo" pudessem suscitar a elaboração de outras propostas que encontrariam eco favorável em todas as forças políticas da nossa democracia.

Abraço.

Maria Margarida Silva disse...

Oi, amigo Aníbal!
Rotativismo, decepção, desânimo e desinteresse são, sem sombra de dúvida e tal como bem referes, alguns dos motivos que levam os cidadãos do nosso país a absterem-se e a alhearem-se do quadro político e, consequentemente, da sua participação no acto eleitoral. É mais “cómodo”, ainda, ficarem em casa ou irem passear do que deslocarem-se às respectivas urnas, para cumprirem com o seu dever. Eu, pessoalmente, tenho uma opinião muito objectiva no que concerne à obrigatoriedade ou não de cumprimento desse acto.
Agora, quanto à proposta do PCP, acho que não é de todo desapropriada (de forma alguma) e deveria ter sido usufruída. “Tinha como propósito constituir-se como um, apenas um, pequeno contributo para a redução da abstenção política e eleitoral”, como mencionas, mas não deixaria de ser oportuna e propícia. Claro que só por si, penso que não seria o suficiente, mas por algum lado tem que se começar e nada melhor do que pelos jovens ou não sejam eles a base e o futuro da nossa sociedade.

Um abraço.
margarida