quarta-feira, 4 de janeiro de 2012

Cuidemos do nosso jardim

Acabei de ler na edição on-line do “Jornal de Negócios: “Portugal é o único país onde a austeridade exigiu mais aos mais pobres”.
Em Portugal os riscos de aumento da pobreza são mais elevados do que no Grécia, Estónia, Irlanda, Reino Unido e Espanha. É o que se concluiu de um estudo divulgado pela Comissão Europeia e onde se comparam as medidas de austeridade adotadas entre os seis países mais afetados pela crise.
A holding da Jerónimo Martins vai pagar impostos na Holanda, a CGD, o banco público, já anunciou que vai encerrar a sua sucursal na Zona Franca da Madeira e transferi-la para o paraíso fiscal das ilhas Caimão.
E o povo!? O que vai fazer o povo. O que vamos fazer? Continuar calmamente a assistir ao aprofundamento da crise social e económica? A engolir a inevitabilidade das medidas de austeridade?
Ontem à noite em conversa informal com um amigo falámos de democracia e liberdade e dos perigos que pendem sobre estes valores. Valores que temos como adquiridos e concluímos que, embora as nossas diferenças ideológicas sejam antagónicas, a democracia está doente e que estamos a perder a liberdade na mesma proporção em que nos privam de direitos.
Um cidadão que está desprovido do direito ao trabalho, um cidadão que aufere um rendimento do trabalho mas tem de ser complementado com o Rendimento Social de Inserção, um cidadão (somos cada vez mais) que tem um vínculo de trabalho precário, não é um cidadão livre.
E, dizia eu, em jeito de provocação, ao meu amigo: - Por isso a luta pelos direitos é tão importante. Direitos e não assistencialismo pois, o que a direita gosta e quer é manter os cidadãos dependentes, fomentar o medo, digo-te mesmo que o que a direita quer é manter os cidadãos aterrorizados. No fundo é o que tu e os teus aliados da direita defendem. Transformar esse domínio exercido pela dependência e pelo medo em apoio eleitoral. E se isto é válido para a direita tradicional também o PS adotou essa estratégia há muito tempo.
Esta conversa da qual deixei o apontamento anterior trouxe-me à memória uma frase do Presidente do Tribunal de Contas, Oliveira Martins, que não posso deixar de subscrever, embora o nosso conceito de democracia não seja coincidente. Dizia então Oliveira Martins a dado passo de uma conferência que proferiu no dia 7 de Dezembro de 2011, em Ponta Delgada: - “A democracia e a liberdade são como duas flores que precisam ser cuidadas todos os dias. A perceção, ou não, deste princípio contribuiu ou, pode ter construído a ideia de que o adquirido era imutável e deixou de se cuidar do jardim onde se plantou a democracia e a liberdade”.
Não posso deixar de estar mais de acordo a defesa da democracia e da liberdade é uma luta de todos os dias. O abandono do exercício dos direitos de cidadania, o deixar “a política para os políticos”, o olhar para o 25 de Abril como apenas um feriado e não como um dia de luta é, assim como descuidar o jardim onde se plantou a democracia e a liberdade.
Só há um caminho. O caminho da luta em defesa da democracia política, social, económica e cultural, o caminho da luta em defesa da liberdade.
Cuidemos do nosso jardim!
Ponta Delgada, 03 de janeiro de 2012

Aníbal C. Pires, In Diário Insular, 04 de janeiro de 2012, Angra do Heroísmo

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