As abordagens que fazemos aos acontecimentos do nosso quotidiano e da nossa vida colectiva têm sempre vários ângulos de análise, aquilo que pode ser uma boa notícia para uns pode, também, constituir-se para outros como a compreensão da acumulação de erros ancorados em opções políticas e económicas que não correspondem, de todo, ao interesse público.
A EDA – Electricidade dos Açores, empresa que produz e distribui energia eléctrica na Região apresentou, em 2009, um resultado líquido de 15 milhões de euros. Digamos que este facto poderá ser considerado uma boa notícia, mesmo sem atender aos tempos de crise que vivemos, se apenas nos ativermos ao facto e, não introduzirmos outras variáveis de análise, como por exemplo a sua privatização, o tarifário eléctrico e os custos associados ao trabalho.
Se considerarmos a privatização facilmente verificamos que a Região perdeu receita, com essa opção política, pois os dividendos são para repartir pelos accionistas, de entre os quais o Grupo Bensaúde detém a maior fatia do capital privado (39,7%).
Se considerarmos o tarifário eléctrico verificamos que desde 2005 o aumento se cifra em cerca de 13%, sendo que em 2008 este aumento foi de 5% e em 2009 cerca de 3%. O que representa aumentos muito acima dos valores médios da inflação e dos aumentos salariais. Os aumentos do tarifário eléctrico tiveram como efeitos a diminuição do rendimento disponível das famílias e o aumento dos custos de exploração para as empresas.
Se consideramos os custos associados ao trabalho verifica-se que os estes se situam a valores de 2004, ou seja, a acumulação de lucros tem beneficiado apenas e só o capital que como se sabe é 49,9% de privados.
Não posso deixar de dizer, em abono do bom rigor, que a eléctrica açoriana tem vindo a promover uma política de investimentos em energias limpas, reduzindo assim a dependência dos combustíveis fosseis e, por consequência, a dependência externa da economia regional.
A fixação do tarifário eléctrico não depende da vontade exclusiva da EDA subordina-se, como se sabe, à orientação de uma entidade reguladora que aplica linearmente as directivas europeias sobre a convergência do tarifário eléctrico preparando caminho para a liberalização do mercado, ou seja, a Região e o País perderam capacidade de decisão sob um sector estratégico do desenvolvimento: o sector energético.
O capital público da EDA é maioritário, ou seja, a Região detém poder de decisão sobre o futuro da EDA, designadamente, sobre o plano de investimentos e a aplicação dos resultados líquidos.
O crescimento dos níveis de produtividade na EDA permitiu um aumento da produção sem aumentar significativamente o número dos seus trabalhadores. Ora, parece-me de elementar justiça que, ao aumento de produtividade corresponda uma melhoria das remunerações do trabalho, ou seja, e para concluir os milhões de euros de lucro da eléctrica regional teriam um impacto maior na economia regional de fossem devolvidos aos açorianos.
Devolvidos aos açorianos por via de um aumento condigno dos trabalhadores da EDA. Devolvidos aos açorianos por via da redução do tarifário eléctrico. E estas sim seriam medidas eficazes de combate à crise.
Esta sim seria uma atitude audaz que contribuiria para dinamizar a economia regional garantindo uma repartição mais justa da riqueza e aliviando as famílias e as empresas do elevado encargo com o tarifário eléctrico.
Mas o PS, com o apoio do PSD, teima em optar por esta política obscena de remuneração da ganância e desvalorização do trabalho e dos trabalhadores, pela minha parte recuso esta política da acumulação da riqueza em vez da sua necessária e justa redistribuição.
Anibal C. Pires, IN A UNIÃO, 16 de Junho de 2010, Angra do Heroísmo
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