quarta-feira, 28 de fevereiro de 2018

Um aparente consenso

Imagem retirada da internet
Mário Fortuna, em representação dos empresários regionais, congratulou-se com as medidas anunciadas, pelo Governo Regional, de reestruturação do Setor Público Empresarial Regional (SPER). Face a esta posição de apoio de Mário Fortuna é caso para Sérgio Ávila e Vasco Cordeiro se questionarem: O que estaremos a fazer de tão errado para merecer o apoio de um dos mais influentes mentores regionais do neoliberalismo económico?
Embora em relação à Associação de Turismos dos Açores (ATA), e na sequência da pergunta de um jornalista, se perceba o que espera o sector privado. Segundo Mário Fortuna, um indefetível das virtualidades do mercado, a saída de capitais públicos da ATA (quer as participações da Região, quer as do Grupo SATA), deixa esta associação sem financiamento e só com a celebração de um contrato programa de médio longo prazo é possível a assunção desta organização pelos privados. Nem mais, a ATA para o domínio privado sim, mas com o necessário financiamento público para continuar a divulgar o destino Açores e a celebrar contratos, aos milhões, com transportadoras aéreas privadas de baixo custo.
Mas o apoio a este anúncio do Governo Regional é mais ou menos generalizado entre os parceiros sociais, ainda que com críticas consoante o interesse político imediato ou mais refletido conforme a matriz ideológica onde se enquadram.
Os trabalhadores e os sindicatos estão preocupados com a manutenção dos postos de trabalho, alguns partidos concordam com parte das decisões anunciadas, discordam de outras e, até consideram que se fica aquém daquilo que seria desejável, outros focam-se no que afirmam ser a fuga para a frente do Governo Regional e do PS agora que a Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores (ALRAA), potestativamente, criou uma Comissão Eventual de Inquérito para avaliar o estado do SPER, ou ainda que o Governo Regional navega sem rumo.
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O PS Açores diz que a decisão resulta do crescimento económico e da atual robustez do sector privado regional, ou seja, a Região pode retirar-se que o mercado resolve. Resolve o quê, A SaúdeAçor regressa à barriga da mãe, bem assim como a SPRHI, de onde nunca deviam ter saído, quanto ao resto com exceção da alienação de 49% da Azores Airlines, pouco interessará ao sector privado, a não ser, como no caso da ATA, que o orçamento regional continue a financiar a sua atividade. Mas esta reestruturação fica aquém do que seria necessário. Empresas públicas como a Azorina, a SDEA ou as Ilhas de Valor deveriam, tal como vai acontecer com a Saúdeaçor e a SPRHI, deviam ser extintas e integradas nos departamentos governamentais de onde nunca deviam ter saído.
Esta decisão do Governo Regional, com as suas insuficiências, vem dar razão a quem sempre defendeu que a criação de empresas públicas como a Saúdeaçor, a SPRHI, a Azorina, as Ilhas de Valor e a SDEA, de entre outras, serviram para que o Governo Regional se demitisse das suas responsabilidades políticas, em áreas tão importantes como a saúde, o ambiente, a coesão e a atração de investimento, bem assim como ao controle democrático da ALRAA. Por outro lado, algumas das medidas anunciadas pecam por tardias e refletem o grau de autismo político que tem caraterizado o PS Açores, desde o limiar do milénio. Foi agora, mas as oposições, com objetivos diferentes, já há muito que o exigiam. Esta pitoresca prática do PS Açores chega a ser politicamente ridícula. Alguns episódios parlamentares que caricaturam esta prática, de ignorar, desvalorizar e chumbar as iniciativas das oposições, para mais tarde assumir como sendo suas, são bem exemplificativos de uma perigosa deriva autoritária que se tem vindo perigosamente a manifestar na incapacidade de diálogo e numa crescente arrogância política do PS Açores.
O consenso, aparente diria eu, que se gerou à volta deste anúncio do Governo Regional necessita de uma avaliação mais detalhada que deve ser patrocinada, desde logo, pelos partidos políticos com assento parlamentar. Subsistem, porém, algumas dúvidas sobre a legitimidade democrática desta decisão do Governo Regional que os eleitores, em particular os cidadãos que deram o seu apoio eleitoral ao PS Açores, devem procurar esclarecer junto do PS e do Governo Regional. Estas medidas, agora anunciadas, não constavam do programa eleitoral que foi sufragado. É certo que a medida 2, do objetivo 4, do capítulo 1.2, do programa eleitoral do PS Açores, se refere concretamente à definição de estratégias, e consequente concretização, do processo de alienação das participações no SPER. Mas não é menos verdade que o PS Açores, durante a campanha eleitoral, sempre fugiu a este debate.
Ponta Delgada, 27 de Fevereiro de 2018

Aníbal C. Pires, In Diário Insular e Açores 9, 28 de Fevereiro de 2018

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