sábado, 17 de março de 2018

De vítima a agressora - crónicas radiofónicas

Ahed Tamimi (Imagem retirada da Internet)



Do arquivo das crónicas radiofónicas na 105FM

Hoje fica o texto da crónica emitida a 30 de Dezembro de 2017 que pode ser ouvida aqui






De vítima a agressora

Ao longo destas semanas tenho abordado vários temas, mas julgo que, ainda em nenhum destes momentos que tenho partilhado consigo, lhe trouxe qualquer assunto da política internacional.
Alguma vez teria de ser, pois se bem se lembra no promocional que antecedeu estas crónicas radiofónicas tinha ficado o compromisso de que tudo, mas mesmo tudo aqui poderia ser abordado, sem tabus.
O assunto que trago hoje é complexo e sem fim à vista, aliás desde a minha meninice que o ouço ser tratado nos noticiários, nem sempre de forma imparcial, e tem-se perpetuado no tempo apesar das Resoluções da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre a questão.
Ahed Tamimi (imagem retirada da Internet)
O que motivou este olhar sobre o conflito que dura e perdura na Palestina não é tanto a questão histórica, embora lhe deixe aqui dois apontamentos. Após a II Guerra Mundial, mais precisamente em 29 de Novembro de 1947, a Organização das Nações Unidas (ONU) aprovou a divisão da Palestina em dois estados, um judeu e outro árabe. Mas como lhe disse a questão é complexa pois, o Estado árabe (a Palestina) não foi internacionalmente reconhecido, ao contrário do que se passou com o estado judeu (Israel) e, essa terá sido uma das razões, a par de outras questões como por exemplo a Declaração de Baulfour, de 1917, que estão na origem deste conflito sem fim à vista. Mas o tema de hoje sendo sobre a questão israelo palestiniana é sobre um acontecimento recente, embora velho nos procedimentos do exército ocupante dos territórios palestinianos. Ou seja, a detenção de crianças e jovens palestinianos pelo exército de Israel. Crianças e jovens que mais não fazem do que opor-se à ocupação do seu território e à violação do direito internacional por parte de Israel.
Uma jovem de 16 anos que desde criança, ao lado da família e com outras crianças e jovens se tem manifestado e oposto à presença dos colonatos judeus e do exército colonizador foi presa. Foi presa durante a noite, e está a ser julgada por um tribunal israelita. A jovem de seu nome Ahed Tamimi foi presa com mais 2 outras mulheres da sua família, uma delas a própria mãe, e está acusada de vários crimes de entre os quais a agressão a dois soldados israelitas. E de facto agrediu dois soldados judeus com pontapés e socos, o vídeo está por aí disponível no youtube para quem o quiser visionar.
Importa, contudo, contextualizar esse acontecimento para entender a agressão da jovem Aehd Tamimi aos dois soldados israelitas. A jovem vive numa pequena localidade de 500 habitantes cercada por colonatos judeus, os soldados encontravam-se no pátio da casa onde vive com os pais e o incidente deu-se depois dos soldados terem disparado sobre um jovem primo da adolescente palestiniana.
Esta contextualização é relevante pois quem visionar o vídeo não entende o comportamento da jovem e a passividade dos soldados.
Ahed Tamimi (imagem retirada da Internet)
Perguntará, com toda a razão, porque lhe trago esta estória, e eu dir-lhe-ei, Porque não tem sido notícia e, sobretudo, porque revela a dualidade de conduta e ação dos movimentos humanitários que face a situações idênticas, mas em contextos diferentes, se mobilizam na denúncia de situações análogas. Mas ao que parece, vá-se lá saber porquê, a jovem Aehd Tamimi não se enquadra como a vítima ideal para ser objeto de apoio internacional, designadamente dos movimentos feministas. Talvez, digo eu, porque esta corajosa jovem nasceu, segundo os critérios ocidentais, no local e no lado errado.
Ahed Tamimi é já um novo ícone da resistência palestiniana à ocupação e colonização que Israel, com o apoio dos Estados Unidos, tem levado a cabo na Palestina, mas a sua prisão e acusação não tem, inexplicavelmente, merecido um amplo movimento internacional de repúdio e condenação de mais este atentado de Israel contra jovens palestinianos.

Aníbal C. Pires, Ponta Delgada, 06 de Janeiro de 2017

Sem comentários: