Foto by Madalena Pires (algures no Sahara, Fev. 2018) |
Do arquivo das crónicas radiofónicas na 105FM
Hoje fica o texto da crónica emitida a 23 de Dezembro de 2017 que pode ser ouvida aqui
Tentativa frustrada
De ano para ano, de Natal para Natal tenho mais dificuldade em formular votos de um Bom Natal e de prosperidade para o novo ciclo temporal que se inicia por estes dias. Não porque não o deseje e sinta, mas porque as palavras que trocamos por estes dias e os comportamentos assumidos perante os outros são de mera circunstância e, ainda que tenha uma esperança inabalável num Mundo melhor, constato a cada Natal que o Mundo não está melhor.
É incontornável, mas tenho-o evitado. Esta tentativa de fuga, Sim trata-se uma tentativa pois, daqui a pouco soarão as palavras mágicas e que todos esperam ouvir. Mas, como lhe dizia, esta minha escusa ao que é comum tem razões e, não são as razões que a razão desconhece existe uma razão para esta minha recusa e que tentarei, mais adiante justificar.
Já o escrevi e publiquei onde habitualmente partilho algumas considerações com quem ainda lê e cultiva a reflexão crítica. Compartilhar. Esse é o objetivo, se o alcanço, ou não só mesmo os ouvintes e leitores o poderão dizer. Alguns dizem que sim, outros que nem por isso, outros são liminarmente contra. Contra o que quer que seja e, outros ainda, não dizem nada, mas vão ouvindo e lendo. O que, em si mesmo, é bom. Não porque o texto nasceu aqui deste lado e as palavras são minhas, mas porque alguém se apropria delas, ouvindo, lendo e ajuizando como muito bem entender. E, é nesse momento que as palavras ganham importância. Até agora não tinham importância, eram apenas minhas, estas palavras, Palavras por vezes sem nexo e à procura mais de uma lógica, que do formalismo linguístico que as ordena lhes dá sentido e rigor, isto tudo sem deixar, porém, de ter em vista uma ética social e política de intervenção para elas, estas e as palavras que se vão seguir.
Mais um Natal… e o Mundo não melhorou. O Mundo desde o último Natal, aquele Natal em que formulámos votos de renovada esperança num Mundo melhor, piorou. Foi o nosso Mundo que piorou não aquele Mundo distante chamado por vezes de Terceiro Mundo. O Mundo dos países pobres ou em desenvolvimento. Não, Não foi esse Mundo foi o nosso Mundo que piorou. Os outros Mundos, que há alguns Natais se afiguravam tão remotos, não têm como piorar. Como poderiam esses Mundos piorar se os seus cidadãos estão há séculos parados no limiar da dignidade humana, impedidos por uma qualquer barreira física ou virtual de passarem o patamar que lhes dá entrada num Mundo onde os desperdícios são uma obscenidade.
O Mundo não melhorou apesar de todos os votos repetidos a cada ano, apesar das promessas que recheiam os discursos da quadra natalícia o Mundo está mais igual na desumanidade que flagela os povos quer sejam do Norte rico ou, do pobre Sul. O Mundo está mais igual na desgraça que graça pelo Mundo.
A esperança sendo velha como o tempo continua inabalável na confiança que tenho no futuro. O nosso futuro coletivo pode ser melhor. E é por isso que lhe desejo um Feliz Natal e os votos de Boas Festas, para si e para todos os nossos concidadãos que partilham o nosso tempo e a nossa casa comum. Faço-o com a consciência que para todos nós podermos aceder ao padrão mínimo daquilo que consideramos serem umas Boas Festas não nos podemos ficar apenas pelo desejo que um dia isso venha a ser possível. Temos de ir mais além e não nos quedarmos apenas pelo espírito natalício.
Tenha um Feliz Natal.
Aníbal C. Pires, Ponta Delgada, 23 de Dezembro de 2017
Sem comentários:
Enviar um comentário